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quarta-feira, 28 de maio de 2014

COMENTÁRIO SOBRE O LIVRO “CACAU” - DE JORGE AMADO

                         

     Autor do comentário – Eng.Agr. Orlando Lisboa de Almeida

           
            Sobre a obra   “C A C A U”

            Como li sem compromisso, fiz a leitura e as anotações utilizando o método que já citei e botei tudo no meu manuscrito – o caderninho.
            Revendo a síntese, é de se notar algumas tendências marcantes na obra a saber:
            Época -  A obra foi escrita por volta de 1933 e busca fazer um retrato da realidade atual daquela época e local.
            O lugar -   A região cacaueira do sul da Bahia, polarizada por Ilhéus.  Retrata principalmente a vida do povo simples, miserável, que trabalhava nas lavouras de cacau da região.
            O tema -   O problema social vivido pelo povo local, explorado pelos coronéis e barões do cacau.   O contraste da opulência dos grandes fazendeiros do cacau, com a miséria dos seus trabalhadores.   
            Uma frase da obra já mostra de forma lacônica a vida daquela gente miserável explorada:    “Educara-se entre tiroteios e mortes”.
            Vale até relembrar algo do famoso João Cabral, onde cita a vida e morte severina:      
                   “De emboscada antes dos vinte,
                    De velhice antes dos trinta,
                    De fome, um pouco por dia”.
            As Expressões   - Há na obra muitas expressões cujo sentido o leitor deve pesquisar para aproveitar melhor o conteúdo da mesma.   Refletem a cultura de um povo e de uma época.    Não é muito zelo destacar que no Brasil há duas identidades culturais muito fortes, sendo a do gaucho, moldada na influência do pré-colombiano, o português o italiano e outras influências mais.  A outra cultura muito marcante é a do povo da Bahia e de algumas outras partes do Nordeste brasileiro, com forte presença de elementos culturais da mãe África.
            Alguns termos que resolvi destacar:  chalacear, ABC, picula, trabalhar “alugado”, rameira, marinete, grapiuna, carpina, quento (não tem no Aurélio e parece ser um vale ou adiantamento de salário), mandrião, estrupício, caçuá, munguzá, aipim, acaçá.
            Engajamento -    Jorge Amado que foi ligado ao Partido Comunista deixa claro nesta obra elaborada em sua juventude, um engajamento na causa socialista de luta de classes, contra a opressão sofrida pelas classes operárias.  Na Europa essa luta já era muito conhecida na época, mas no Brasil era algo novo e bastante combatida.    Ser “vermelho”  era ser inimigo da sociedade, das elites que sempre foram o poder político.
            Costumes -  Alguns que destaquei:
·        Batizados coletivos dos filhos dos empregados, tendo como padrinhos, os patrões.   Garantia de manutenção da submissão dos empregados e da perenização da exploração.
·        A semana de festa para comemoração de São João, festa muito popular na época na região e em todo o Nordeste até os dias atuais.
·        A lida na lavoura cacaueira e a forma de manipular o cacau envolvendo podas, colheita, separação das sementes e secagem destas para o comércio.
·        As comidas típicas do dia-a-dia do povo pobre.
·        O rito de passagem do garoto para a idade adulta.   Aos doze anos, o pai leva o filho à zona e este acaba pegando uma doença venérea.  Assim, está promovido ao mundo dos adultos e tem até seu salário aumentado.
·        Os retirantes da seca, o drama e a vontade de retornar à terra natal.

Manifestações do Engajamento  -  como o engajamento político é o
 ponto mais visível da obra, destaco alguns comentários sobre o mesmo:
·        Trabalhar alugado -  o termo é chocante e serve para o trabalhador abrir os olhos e perceber que virou mercadoria à serviço do lucro.   Chocar para conscientizar e fomentar a luta de classes, visando o fim da opressão.
·        Armazém da fazenda -   existiu e ainda existe isto pelo interior do Brasil.   Quando o empregado migra para trabalhar numa fazenda, já chega devendo a mudança ao novo patrão.   Este tem na fazenda um armazém onde o empregado se abastece sem saber o preço das mercadorias, muitas vezes.   Assim, seu saldo será quase sempre negativo.    Trabalha, trabalha e está sempre devendo...  saldo negativo.    Foi disto que surgiu o termo “pedir a conta”.   Quando um empregado queria saber seu saldo efetivo, estaria ao mesmo tempo rompendo o elo de confiança com o patrão e era despedido.
Não é coisa do passado isto no Brasil.   Nas novas fronteiras agrícolas isto ainda é um tanto recorrente, infelizmente.
·        Gestão da fábrica  -  citou uma forma de gestão mais ética e mais humana de uma fábrica de tecido, visando mostrar que, mesmo sendo capitalista, há como tratar os empregados com mais dignidade.
·        Guarda noturno -  O guarda tinha o senso classista e, apesar de sua miséria, ajudou o retirante que estava passando fome.
·        As rameiras -  acusa a opressão e acena com a união das classes oprimidas como solução.
·        A escola -  reproduzindo o sistema opressor, assim como a igreja no local e época também faria o mesmo.    Também destaca a imprensa que enaltece os nobres feitos do “generoso” coronel fulano, que na realidade é um explorador dos fracos.
·        Deus  -  uma visão de um deus mostrado pela igreja local.  Um deus coronel que quer bem aos ricos e despreza os pobres.  É um deus carrasco e inimigo dos pobres.
·        Analfabetismo -  como arma política para manter os miseráveis sempre nessa condição ao longo dos tempos e gerações.
·        Preguiçoso -   No chavão do opressor e de muitos desavisados, o pobre vive na miséria porque quer, porque não pega duro no trabalho.    Sem levar em conta que o trabalhador muitas vezes ganha pouco, trabalha desnutrido, com doença crônica e assim por diante.
·        Utopia -  Na obra, os oprimidos representados pelas prostitutas, os trabalhadores do cacau, os retirantes, sonham com algo que não entendem, mas que resumem toda a esperança:  “Um dia...”    É a síntese de algo de bom que teria de acontecer, não sabiam como.   O sonho de liberdade, do fim da opressão e da miséria.
·        Protagonista -   Quando este, calejado da vida de alugado, consciente do sentido classista, renuncia ao amor da filha do patrão e parte para uma região metropolitana buscando trabalho com dignidade, sabendo que vai enfrentar a luta em defesa da sua classe trabalhadora.

Desfecho -    A última frase do livro deixa de forma textual o engajamento do autor, pelo dizer do seu protagonista:

-          “Eu partia para a luta de coração limpo e feliz”.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

RESENHA DO LIVRO – A HISTÓRIA ME ABSOLVERÁ


Autor do livro:  Fidel Castro              - data da resenha  14-05-14

Resenha por Orlando Lisboa de Almeida

     O livro é o “Discurso de Fidel Castro ante o Tribunal de Exceção de Santiago de Cuba, proferido em 16-10-1953”      - Quando ele foi preso incomunicável e em seguida julgado após a ação que tentou a tomada do Quartel de Moncada.
     Em 1959 Fidel, que liderou a derrocada do governo do ditador (pro americano) Fulgêncio Batista, assume o governo revolucionário e socialista de Cuba.
     Vamos a um apanhado das passagens que mais me chamaram a atenção nesse livro que foi editado no BR pela Editora Alfa-Omega em 1982 (4ª.edição) – 105 páginas.
     Página 13 -   “Quando os homens têm um mesmo ideal, ninguém pode isolá-los, nem as paredes de um cárcere nem a terra dos cemitérios”.
     Fidel é advogado e na ocasião, assumiu a própria defesa, mesmo o Estado não tendo permitido que ele (preso) tivesse acesso aos livros que tratam das leis do seu País.
     17 – “À medida que se ia processando o julgamento, os papéis se inverteram:  os que iam acusar foram acusados e os acusados se converteram a acusadores.”
     21 -  Ciente de que a ditadura iria condená-lo injustamente.   “Mas a minha voz não se afogará por isso; ela adquire forças em meu peito quanto mais isolado me sentir.  E quero dar ao meu coração todo o calor que lhe negam as almas covardes.”
     31 – “Nunca foi nossa intenção lutar com os soldados do regime e sim apoderar-nos, de surpresa, do quartel e das armas, convocar o povo, em seguida reunir os militares e convidá-los a abandonar a odiosa bandeira da tirania e a abraçar a da LIBERDADE.”
     33 – Trecho em que explica um pouco da história de Cuba.  No final do século 18, Cuba lutou em várias batalhas para se libertar do jugo espanhol.   Na vez que obteve sucesso, teve apoio dos americanos.  Por outro lado, trocaram de império e passaram a ser explorados pelos americanos por décadas com concentração de renda na mão dos estrangeiros e a pobreza para o povo cubano.      Em 1952 haveria uma eleição presidencial e a oposição ao governo simpático aos americanos estava com grande chance de vence-la.   Antes das eleições, Fulgêncio Batista deu um golpe militar em 10-03-1952 e assim sepultou a eleição que viria e a chance dos cubanos se verem livres dos americanos.    Nota-se que Fidel surge como uma reação contrária à ditadura militar em Cuba que oprimia o povo e fazia o jogo dos americanos.
     37 – O governo militar fazia desfiles apresentando ostensivamente ao povo as armas pesadas e sofisticadas.
     “Os desfiles militares e as aparatosas exibições de equipamentos bélicos visam fomentar esse mito e criar no povo um complexo de absoluta impotência.   Nenhuma arma, nenhuma força é capaz de vencer um povo que decide a lutar por seus direitos.”
     41 – “Os demagogos e os políticos profissionais fazem o milagre de estar de bem com todos e com tudo, mas, obrigatoriamente, enganam a todos em tudo que fazem.  Os revolucionários devem proclamar suas idéias corajosamente, definir seus princípios e expressar suas intenções para que ninguém se iluda, amigos ou inimigos”.
     42 – Ele dá um panorama das condições de vida do povo cubano antes da Revolução.  500 mil operários do campo vivendo em bohíos (casebres do tipo que os nativos locais usavam antes da colonização espanhola) e tendo trabalho 4 meses do ano e o restante do ano passando fome sem ter terra para plantar.  85% dos trabalhadores da lavoura o faziam em terras dos outros – terras arrendadas.  Operários nas cidades com salários tão baixos que no fim do mês o salário transitava da mão do empregado para o armazém.   Empregados   “cuja vida é o trabalho eterno e o descanso é o túmulo”
     46 – Fidel cita as Leis Revolucionárias da Cuba comunista – reforma agrária, reforma urbana, nacionalização das companhias de energia, de telecomunicações, etc.
     “O primeiro governo oriundo de eleição popular deveria respeitá-las, não só porque teria um compromisso moral com a nação, como porque os povos quando alcançam conquistas ansiadas durante várias gerações, nenhuma força do mundo será capaz de arrebatá-las.”
    46 a 49 – Ele dá um panorama geral de Cuba até 1952 expondo a condição de miséria em que o povo vivia.   Nessa época Cuba tinha 5,5 milhões de habitantes.    De maio a dezembro, quase 1 milhão de desempregados anualmente.  Um absurdo.
     51     “E no mundo atual nenhum problema social é resolvido por geração espontânea.”
     53 – “Um povo culto sempre será forte e livre”.
     56 – “... o inconcebível é que a maioria das famílias nos nossos campos esteja vivendo em piores condições que os índios encontrados por Colombo ao descobrir a terra mais formosa que os olhos humanos já viram.”
     63 – “O verdadeiro militar, ou o verdadeiro homem, é incapaz de manchar sua vida com a mentira e o crime.”       
     68 – Sobre o ataque ao Quartel de Moncada.     “... era uma vergonha e uma desonra para o Exército ter tido em combate três vezes mais baixas que os atacantes.”
     75 – Sobre a chacina que o Exército fez logo em seguida ao aprisionar os rebeldes, violando as leis.    “Se o Exército teve dezenove mortos e trinta feridos, como é possível que tenhamos tido oitenta mortos e cinco feridos?”     (executaram os rebeldes pegos)
     80 – Falando do judiciário que fazia o jogo da ditadura de Batista:     “ a alta magistratura...sem um gesto digno, curvou-se .. traindo a nação e renunciando à independência do Poder Judiciário”.
     80 – Sobre o julgamento a que estava sendo submetido:   “... pura comédia para dar a aparência de legalidade e de justiça à arbitrariedade...”
     85 -  Preso, incomunicável, levado a julgamento num hospital depois que forjaram um laudo de que ele não estaria em condições de estar num tribunal.     O promotor pede 26 anos de prisão para o réu.
     93 –Fidel cita a Constituição e as leis do país, mostrando que o regime criou leis que ferem frontalmente a Constituição.  Dá detalhes de tudo.   Mostra que não há nada de legitimidade nem ao regime que o julga, menos para as pessoas que o julgam.
    94 -  A maioria dos ministros do Executivo podia (contra a Constituição) por lei da ditadura, mudar tudo nas leis e os ministros eram escolha do governante.  Então o governante tudo podia.   Tirania.
     95 – Aqui ele diz algo que também foi uma polêmica no BR na ocasião que se instalou a Constituinte para a Carta de 1988.    Ele fala em relação a Cuba:
     “É um princípio elementar de Direito Público que não existe constitucionalidade onde o Poder Constituinte e o Poder Legislativo estão fundidos no mesmo organismo.”
     98 – A força do povo – cita um pensamento indiano:   “A corda torcida por muitas fibras é suficiente para arrastar um leão.”
     98 – Sobre o destino que o povo deve dar aos tiranos, Fidel fez uma revisão histórica do tema desde antes de Cristo e citou os mais relevantes.    Sobre São Tomas de Aquino, na Summa  theologica  “Rechaçou a doutrina do tiranicidio, mas sustentou, sem embargo, a tese de que os tiranos deveriam ser depostos pelo povo.”     Outros pensadores antigos defendiam varias formas de eliminação, pelo povo, do tirano.
     100 – Cita a Revolução Francesa, a luta pela liberdade e dignidade humana.    A Constituição de 1940 de Cuba já tinha uns traços das correntes socialistas vindos da França.    Itens como a Função Social da Propriedade Rural, o direito ao homem de uma vida digna, etc.   
     100 – Cita o pensador John Milton (1649) ... “o poder político emana do povo, que pode nomear e destituir reis e tem o dever de afastar os tiranos.”
     100 – Cita Rousseau -   em sua obra Contrato Social.    “o mais forte não é nunca suficientemente forte para ser sempre o amo, se não transforma a força em direito e a obediência em dever.”
     105 – “Preferimos que Cuba desapareça no mar, a consentir que nosso povo seja escravo de alguém”.
     105 – Termina esse seu pronunciamento de defesa pedindo sua “condenação” para ir preso junto com seus pares revolucionários, também injustiçados.
     106 – Frase que encerra o pronunciamento de Fidel no tribunal e dá um sentido ao título desta sua obra.
     “Quanto a mim, sei que a prisão será dura como tem sido para todos – prenhe de ameaças, de vil e covarde rancor.   Mas não a temo, como não temo a fúria do tirano miserável que arrancou a vida a setenta de meus irmãos.  CONDENAI-ME, NÃO IMPORTA.   A HISTÓRIA ME ABSOLVERÁ.”

                           orlando_lisboa@terra.com.br